Tiveram um Inverno rigoroso, farto de frio e chuvas, muitas inundações, muitas ausências de Alberto que só aparecía à mesa do pequeno-almoço . Mostrava-se mais preocupado para além do normal e quando vieram instalar o telefone no escritório passou a fazer daquele cómodo lugar de refeição também, quando ficava em casa a trabalhar.
Vinham muitos homens visitá-lo, por vezes acompanhados de uma ou outra secretária, deselegantes, feias mesmo, mulheres atacarradas nos sapatos rasos. Maria da Luz vía passá-las e por vezes quase desejava ser uma delas, andar por aí, saír, ouvir falar. Nunca lhes dirigiu a palavra tentava não se aproximar da porta do escritório conforme as ordens do marido. Nessas alturas até a governanta estava proibida de entrar.
Em Janeiro e logo depois do primeiro aniversário de Rosmaninho, Alberto passou a andar de carro com motorista. Ficava encostado ao carro, à espera, numa prontidão servil de abrir a porta ao Doutor e arrancar silencioso. Maria da Luz espreitava-o entre os cortinados, observava-lhe as mãos, a farda negra e o boné de pala dura. De um dia para o outro deixou a farda, paramentara-se de fato negro e camisa branca como tantos que entravam na sua casa, o chapéu de feltro com faixa preta a altear-lhe o tamanho.
No mês seguinte dispensaram os serviços da ama de leite que chorosa, abraçou muito Rosmaninho e lhe chamou meu menino. Foi-se com o filho e nunca mais souberam dela, o motorista levou-a à estação de Sta Apolónia desaparecendo como o fumo libertado pelo apito da partida.
Foi nessa altura que D.Lídia teve uma gripe que a atirou à cama. Chamaram o médico, delirava, chamava pelo Doutor, tentava despir-se.
Maria da Luz nessa noite não fechou a porta do seu quarto.